Por Bruna Rodrigues, Rio Bonito. *
Desconstrução de padrões estéticos e histórico-culturais tem marcado produção de conteúdo nos dias atuais, mas ainda demanda ações e mudanças efetivas
Bombardeados por inúmeras imagens e formas de entretenimento, é comum acessar dispositivos ou folhear páginas e se deparar com histórias e rostos que parecem muito semelhantes uns com os outros e pouco identificáveis com a grande variedade do público; O padrão predominante segue o perfil de pessoas brancas, muitas vezes masculinos, americanizados ou eurocentristas. Porém, recentemente, a diversidade passou a ser uma demanda no universo televisivo, cinematográfico e até mesmo nas histórias em quadrinhos.
E é para a promoção desse debate que o ilustrador carioca Anderson Awvas tem voltado seu trabalho na área. Autor do projeto “Folcore BR: Uma Nova Visão”, que retratou figuras do Folclore brasileiro como personagens de animações 3D, Awvas é o convidado da Oficina “Olhares Múltiplos para a Produção e o Consumo da Comunicação Visual”, promovida pelo Projeto Dissemina da Universidade Federal Fluminense nesta sexta-feira (26).
- O meu entorno, as coisas que eu consumia, produzia e pensava, sempre estiveram ligados a esse mercado branco e voltado para uma beleza padrão, eurocêntrica, usando as mesmas fórmulas, os mesmos exemplos. Isso me fez perceber o quanto eu estava sendo influenciado. Quando comecei a criar histórias em quadrinhos focadas no meu cotidiano, passei a entender que tinha muita gente que se identificava com aquilo, e que minha aparência também tinha um lugar de identificação - disse o artista ao comentar sobre o que despertou sua atenção para a problemática.
Não é difícil pensar em exemplos do gênero. Na última década, quando as discussões sobre representatividade ainda engatinhavam, a Disney atingiu uma nova geração que não podia se enxergar em suas princesas clássicas ao produzir o filme “A Princesa e o Sapo”, de 2009, com uma protagonista negra - a primeira na realeza da produtora.
O universo dos quadrinhos, área de atuação de Awvas, também abraçou uma representatividade maior nos últimos anos com a criação de personagens negros, latinos e árabes; os mais recentes são Miles Morales, Riri Williams, America Chávez e Kamala Khan, da Marvel Comics, e Yara Flor, a nova Mulher Maravilha da DC Comics que possui origem brasileira e amazonense. Porém, mesmo com as notáveis mudanças na mídia, essa leva de personagens e histórias ainda são minoritárias.
- O mercado sempre vai dar uma atenção maior para o público que está no topo dele. Quando temos um mercado totalmente voltado para um público branco, de classe média, pensamos em como agradá-los para que mais dinheiro saia dali, porque no capitalismo a plateia é formada quem dá a grana. Hoje é visto que existem outros públicos, ávidos por um outro tipo de conteúdo, e essa galera está prestando atenção nisso, mas não porque eles entenderam que a humanidade é grande. Eles continuam com a manutenção desse patamar - explica Awvas.
O caminho para uma comunicação visual mais representativa e que de fato seja um reflexo da sociedade que reproduz é longo e demanda muito trabalho em diversos âmbitos. Mas para Anderson, um ponto fundamental de partida é a introdução de pessoas que pertencem às minorias nos processos criativos.
- Quando você coloca pessoas periféricas para tomar conta de um produto, você tem o desencadeamento de possibilidades que estão centradas no que essa pessoa pensa. Precisa ser alguém que pensa para fazer entender que esses lugares precisam ser ocupados por essas visões, por esse olhar diferente - conclui.
Além do projeto "Folclore BR”, outras iniciativas têm tido sucesso em trazer o debate da diversidade para a produção cultural. Entre vários exemplos, Anderson Awvas cita o pianista afrofuturista Jonathan Ferr, a WoloTV, plataforma de streaming voltada para narrativas negras, a ilustradora Geneva, que retrata as infinitas diversidades que englobam a mulher negra, e o ilustrador e quadrinista Marcus Williams, cujo trabalho é voltado para o universo das séries e dos super-heróis.
A Oficina “Olhares Múltiplos para a Produção e o Consumo da Comunicação Visual”, com objetivo de trazer a reflexão e apresentar meios para a construção de uma mídia mais representativa, é gratuita e destinada para estudantes de graduação ou que possuem interesse na área da produção visual. As inscrições seguem abertas por meio do link bit.ly/2OHhp3F. O encontro será realizado nesta sexta-feira, 26, de 16h às 18h.
*Bruna Rodrigues é estudante de Jornalismo da Universidade Federal Fluminense.
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